A compreensão
humana não é um exame desinteressado, mas recebe infusões da vontade e dos
afetos; disso se originam ciências que podem ser chamadas “ciências conforme a
nossa vontade”. Pois um homem acredita mais facilmente no que gostaria que
fosse verdade. Assim, ele rejeita coisas difíceis pela impaciência de
pesquisar; coisas sensatas, porque diminuem a esperança; as coisas mais
profundas da natureza, por superstição; a luz da experiência, por arrogância e
orgulho; coisas que não são comumente aceitas, por deferência à opinião do vulgo.
Em suma, inúmeras são as maneiras, e às vezes imperceptíveis, pelas quais os
afetos colorem e contaminam o entendimento. (Francis Bacon – Novum organon,
1620)
Algo vem me preocupando nos últimos tempos: a geração e divulgação de
boatos, mentiras, falácias, inverdades e meias verdades nas redes sociais. Um
fenômeno que pode parecer de pouca importância, mas, sem que percebamos, ele
tem influenciado o nosso cotidiano. Muitas vezes de maneira trágica! Lembro
aqui o caso recente da mulher que foi morta por linchamento, devido ao fato de
ter sido confundida com uma suposta sequestradora, através de um post publicado
no facebook. Evento trágico, que foi resultado de mais um boato nesta “Era da
Boataria Virtual”! Além de eventos como estes, onde vidas se perdem devido a
boatos na internet, temos o uso indiscriminado da divulgação de boatos agora
que se aproxima o processo eleitoral. Pautados no fato das pessoas não buscarem
as fontes do que veem, partidos e candidatos usando de má fé se utilizam desta
ferramenta para difamar os adversários.
Vivemos na sociedade da mentira, o boato, a falácia, fazem
parte do mundo político, social e do mercado. É só repararmos nas propagandas
que prometem milagres induzindo as pessoas a comprarem a felicidade e a
juventude, é só lembrarmos dos discursos de políticos que utilizam da
retórica para mover as massas de acordo com seus interesses, evento
recente foi o processo de mudanças no código florestal, onde pequenos
agricultores foram induzidos a partir da retórica de deputados ruralistas a
apoiarem os projetos deste setor político, mesmo que estes projetos não beneficiassem
estes pequenos agricultores utilizados no processo, mas sim os
latifundiários.
Entendo que na "Era da Boataria Virtual" as vezes é
difícil distinguir o que é fato e o que é boato, mas existe uma ferramenta que
pode servir de base para isso. São alguns procedimentos simples que se bem
utilizados podem nos servir como uma espécie
de "Detector de Mentiras".
Nos anos 80 Carl Sagan publicou um artigo chamado "A Refinada Arte de
Detectar Mentiras", neste artigo ele nos apresenta uma síntese deste
método que apresento logo abaixo
Segundo Sagan ao analisarmos uma ideia ou
proposição (uma proposição neste sentido pode ser uma afirmação política,
cientifica ou religiosa, uma suposta noticia, ou até uma propaganda de algum produto):
"A questão não é se gostamos da conclusão
que emerge de uma cadeia de raciocínio, mas se a conclusão deriva da premissa
ou do ponto de partida e se essa premissa é verdadeira.
Eis algumas das ferramentas:
1- Sempre que possível, deve haver confirmação
independente dos “fatos”.
2- Devemos
estimular um debate substantivo sobre as evidências, do qual participarão
notórios partidários de todos os pontos de vista.
3- Os
argumentos de autoridade têm pouca importância — as “autoridades” cometeram
erros no passado. Voltarão a cometê-los no futuro. Uma forma melhor de
expressar essa ideia é talvez dizer que na ciência não existem autoridades;
quando muito, há especialistas.
4- Devemos
considerar mais de uma hipótese. Se alguma coisa deve ser explicada, é
preciso pensar em todas as maneiras diferentes pelas quais poderia ser
explicada.
5- Depois
devemos pensar nos testes que poderiam servir para invalidar sistematicamente
cada uma das alternativas. O que sobreviver, a hipótese que resistir a
todas as refutações nessa seleção darwiniana entre as “múltiplas hipóteses
eficazes”, tem uma chance muito melhor de ser a resposta correta do que se
tivéssemos simplesmente adotado a primeira ideia que prendeu nossa imaginação.
6- Devemos
tentar não ficar demasiado ligados a uma hipótese, só por ser a nossa. É
apenas uma estação intermediária na busca do conhecimento.
7- Devemos nos perguntar por que a ideia nos agrada.
7- Devemos nos perguntar por que a ideia nos agrada.
8- Devemos
compará-la imparcialmente com as alternativas.
9-Devemos verificar se é possível encontrar razões para rejeitá-la. Se não, outros o farão.
9-Devemos verificar se é possível encontrar razões para rejeitá-la. Se não, outros o farão.
10- Devemos
quantificar. Se o que estiver sendo explicado é passível de medição, de ser
relacionado a alguma quantidade numérica, seremos muito mais capazes de
discriminar entre as hipóteses concorrentes. O que é vago e qualitativo é
suscetível de muitas explicações. Há certamente verdades a serem buscadas nas
muitas questões qualitativas que somos obrigados a enfrentar, mas encontrá-las
é mais desafiador.
11- Se há
uma cadeia de argumentos, todos os elos na cadeia devem funcionar (inclusive a
premissa) — e não apenas a maioria deles.
12- A
Navalha de Occam. Essa maneira prática e conveniente de proceder nos incita
a escolher a mais simples dentre duas hipóteses que explicam os dados com igual
eficiência.
13- Devemos
sempre perguntar se a hipótese pode ser, pelo menos em princípio, falseada.
As proposições que não podem ser testadas ou falseadas não valem grande coisa.
Considere-se a ideia grandiosa de que o nosso Universo e tudo o que nele existe
é apenas uma partícula elementar — um elétron, por exemplo — num Cosmos muito
maior. Mas, se nunca obtemos informações de fora de nosso Universo, essa ideia
não se torna impossível de ser refutada? Devemos poder verificar as
afirmativas. Os céticos inveterados devem ter a oportunidade de seguir o nosso
raciocínio, copiar os nossos experimentos e ver se chegam ao mesmo resultado."
Estas dicas acima fazem parte
do chamado Método Científico, e podem ser utilizadas (cada uma delas dentro de
suas especificidades) também no cotidiano, ao lidarmos com boatos nas redes
sociais, ao lidarmos com a política e com políticos, e até nas relações de
consumo.”
Agora que você sabe o que fazer para
filtrar o boato da verdade, a falácia do fato siga esta dica NÃO DIVULGUE
BOATOS! USE ESTA PEQUENA RECEITA NO SEU DIA A DIA E SEJA MENOS MANIPULADO E
ENGANADO!
No próximo texto irei trabalhar, a partir
do mesmo artigo “A Refinada Arte de detectar Mentiras” como detectar as “falácias
mais comuns” e “perigosas da lógica e da retórica” que muitas vezes costumamos
ver sendo utilizadas por ai, inclusive por políticos (quando não principalmente
por estes).
Este texto se baseia no capítulo 12, do livro O Mundo Assombrado pelos Demônios: a Ciência vista como uma vela no escuro.
O livro pode ser encontrado, em PDF, neste link:
https://www.academia.edu/15585004/Carl_sagan_o_mundo_assombrado_pelos_demonios
Este texto se baseia no capítulo 12, do livro O Mundo Assombrado pelos Demônios: a Ciência vista como uma vela no escuro.
O livro pode ser encontrado, em PDF, neste link:
https://www.academia.edu/15585004/Carl_sagan_o_mundo_assombrado_pelos_demonios
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